Jorge Fernando dos Santos

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Nos braços da viola

A música brasileira sempre fez parte da minha vida, desde a infância em Venda Nova, quando meu avô paterno tocava violão e ouvia discos em sua radiola. O móvel feito pelo meu pai em modelo Luís XV está hoje no meu quarto, servindo de sapateira. Muitos daqueles vinis que tocavam na tal radiola fazem parte do meu pequeno acervo de discos.

Em frente à nossa casa, na Rua Padre Pedro Pinto, morava um jovem efeminado que tocava piano, violão e acordeon. Nossos pais eram amigos e sua casa sempre reunia pessoas em saraus e festas juninas. Foi lá que ouvi a expressão “bossa nova” pela primeira vez. E ao ouvir o tal sujeito tocando um samba nesse ritmo ao piano, passei a prestar atenção em cantores como João Gilberto e Roberto Carlos – que naquela época tentava imitá-lo.

Na adolescência, já residindo no bairro Caiçara, acompanhei pelo rádio e pela televisão todos os movimentos musicais pós-bossanovísticos. Primeiro a Jovem Guarda, de Roberto, Erasmo Carlos e Wandeleia. Depois a Tropicália, tendo à frente Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa e os Mutantes. Também curti a turma da pilantragem, liderada pelo grande cantor Wilson Simonal, com espaço para Jorge Ben (ainda sem o Jor). Como outros garotos daquela época, era impossível não amar Beatles e Rolling Stones.

Tudo isso fez a geléia geral da minha formação musical, enriquecida pelas aulas de arte e canto do Colégio Anchieta, onde pela primeira vez prestei atenção em Bach, Beethoven, Chico Buarque e Geraldo Vandré. Já minha coleção de discos de MPB começou no dia em que troquei um LP do Garry Glitter por um de Toquinho e Vinicius. A partir daquele dia, comprei todas aquelas coleções de bancas de revista e me tornei um expert na biografia dos grandes compositores brasileiros. De Noel Rosa a Milton Nascimento, eu sabia tudo, tim-tim por tim-tim.

Confesso, no entanto, que tinha certa resistência às modas caipiras e aos trinados da viola de 10 cordas. Isso talvez encontre explicação no fato de a mídia eletrônica sempre ter dado pouco espaço para esse tipo de música. Quando finalmente começaram a surgir as duplas sertanejas mais modernosas, fazendo o som no estilo “breganejo” ou “sertanojo”, percebi que alguma coisa ruim estava acontecendo com a nossa música.

Talvez para desagravar essa constatação, corri para os caipiras legítimos e descobri a genialidade de duplas como Jararaca e Ratinho, Alvarenga e Ranchinho, Tonico e Tinoco. Na casa do meu pai tinha discos de Cascatinha e Inhana, cujas músicas minha mãe cantava no tanque de lavar roupa. Aquilo sim, era a legítima música sertaneja, com letras românticas bem construídas e melodias delicadas em vozes perfeitamente harmônicas.

Mesmo naquele tempo, eu ainda não era capaz de imaginar que um dia mergulharia fundo no universo da cultura caipira para escrever roteiro e texto final para um programa de TV. Por mais que a gente tente remar o barco rio-acima, às vezes a vida nos empurra rio-abaixo e, para nossa surpresa, desaguamos num mar de tranquilidade.

Foi assim que me senti quando Saulo Laranjeira me convidou para ajudá-lo a realizar o programa Nos Braços da Viola, que vai ao ar das 20h às 21h, toda segunda-feira, pela TV Brasil, sendo transmitido para vários estados, podendo ser visto no site www.tvbrasil.org.br. Curioso ainda é que por conta desse programa fui convidado a participar do Sem Censura, campeão de audiência da emissora apresentado pela jornalista Lêda Nagle.

É, viver é mesmo muito perigoso, diria Guimarães Rosa, ele próprio um aficionado em viola. Uma das pessoas responsáveis pelo meu “mergulho” no universo caipira é o violeiro Chico Lobo, parceiro com o qual dividi a trilha sonora da minissérie Palmeira Seca, adaptada do meu romance ganhador do Prêmio Guimarães Rosa pelo cineasta Breno Milagres, em 2002, com exibição pela Rede Minas.

De lá para cá fiz várias modas de viola, em parceria com o próprio Chico, Rodrigo Delage, Francisco Saraiva, Wilson Dias e Max Rosa, que até agora só conheço pelo telefone e pela Internet. Eis aí a viola cibernética, rompendo os limites do universo virtual rumo ao futuro! Oxalá os novos violeiros talentosíssimos que têm surgido pelo país afora possam de fato resgatar a nossa cultura musical mais autêntica, que teve início durante a colonização, quando os jesuítas tocavam viola para atrair os índios à catequese.

O Brasil carece mesmo de ser recatequizado, para reaver sua alma e sua identidade cultural. O programa Nos Braços da Viola contribui nesse sentido, colocando na telinha e no horário nobre uma das principais expressões de nossa música mais autêntica.

  

6 comentários em “Nos braços da viola”

  1. Sou estudante de antropologia da UFMG e quero fazer um estudo sobre o imaginário da viola caipira, gostaria de saber como faço para obter todas as gravações do programa “Nos Braços da Viola”, seria possível?Desde já agradeço.

  2. Olá, Jorge F. dos Santos, como vai, tudo bem?
    Olhe… coisa….ontem foi a 1ª vez que vi seu programa, que fiquei sabendo que ele existia. Ôh, desulpe-me, por favor, é que não assisto muito a tv. Fiquei um pouco frustrada com a descoberta tardia, pois amo viola, viola é a minha paixão! E a-do-rei seu programa. Simplesmente o máximo! Gostaria de saber se o violeiro da minha terra, Almir Sater, já participou do programa alguma vez. Ou se vai participar.
    Abraços! A paz de Deus contigo!

  3. Olá Jorge! Meu nome é Elisana de Assis e quero compartilhar com você um violeiro (tocador de viola); Cláudio Alexandrino que é betinense (MG), compositor e o “maior” colecionador de violas caipiras antigas e artesanais de que se têm notícias e é conhecido como “Caçador de Violas”. No momento sua coleção conta com 110 preciosidades, algumas da época do império e feitas na antiga cidade “Queluz de Minas”, hoje conhecida como Conselheiro Lafaiete – MG; ficando conhecidas então por “Violas de Queluz”, este modelo seguia a antiga viola que era fabricada desde o século XV em Portugal, com cravelhas de madeira, cavalete trabalhado, e a trasteira, ou escala, – madeira onde se fixam os trastos – no mesmo nível do tampo ou texto sonoro do instrumento e toda marchetada com flores, pássaros e arabescos, a técnica de incrustação dominava a criação dos artistas em um estilo decorativo com muita beleza, seguindo as regras do estilo rococó, sendo que esse modelo de viola ganhou prêmios nacionais e também internacionais. A coleção conta com violas com mais de cem anos.

    Cláudio Alexandrino nascido em 1973 adquiriu a sua primeira viola caipira aos 27 anos. Diferente da maioria dos violeiros que começaram pelo violão, Cláudio Alexandrino começou estudando a viola caipira e pretende continuar somente nela. Cláudio costuma dizer: “Foi quando descobri que tenho um dom e, de aprendiz, virei violeiro e colecionador”.
    Em matérias de jornais, revistas e programas de TV, alguns nacionais, ele é considerado a maior autoridade no momento sobre a história das violas de “Queluz” e tantos outros modelos espalhados por Minas Gerais; suas variadas exposições foram visitadas por mais de 10.000 mil pessoas, entre brasileiros e estrangeiros; Cláudio Alexandrino se apaixonou pela viola e decidiu contar a história do instrumento através de sua coleção. Em seu acervo, além das violas de “Queluz” contêm algumas ferramentas usadas na confecção das mesmas, como, formas para montagem dos instrumentos, graminho, serra de São José, furadeira manual e outros.
    Cláudio Alexandrino começou sua coleção em 2001 e desde então trouxe pra mídia a história destas lindas violas que até Dom Pedro II descreveu com detalhes em seu diário quando de sua passagem por Queluz de Minas em direção a Ouro Preto em 1881, ficando extasiado com a beleza e o som que elas emitiam: “Apareceu o violeiro – fazem-se aqui muitas violas. O rapaz tocou bem a viola e melhor violão também feito aqui…”.
    A finalidade desta coleção é levar ao conhecimento a todos aqueles que apreciam este rico instrumento, o som, a história e a cultura que ele nos traz; o som da viola nos remete a um passado distante, nos faz lembrar do campo, fogão a lenha…
    Cláudio Alexandrino faz “suas aquisições” em viagens por Minas e em outros estados; além disso, faz trabalhos de pesquisa, recolhe e resgata músicas de domínio público, contos e tradições dos antigos violeiros; escreve um diário de bordo juntamente com sua esposa sobre as curiosidades e dificuldades desse mundão caipira nas viagens que fazem e estão pensando em publicar; mas nesse ano será publicado um livro sobre a história das Violas de Minas, desde sua origem até os dias atuais, com muitas fotos.
    Com isso Cláudio Alexandrino está se formando como violeiro, criando um repertório bem característico destas viagens. Ele diz que cuida delas com “muito carinho” e que seu projeto agora é lutar por um museu. Disse ainda que espera em breve, conseguir um local para instalar um memorial definitivo que será um ponto de referência dos violeiros.
    Eu sei que tem vários violeiros por esse nosso mundão, mas esse tem um brilho especial, ele é autêntico e faz tudo de coração, sinto isso.
    No http://www.myspace.com/claudioalexandrino tem as informações necessárias para uma visão sobre o assunto, você terá uma idéia do que eu lhes falei acima, além disso, contêm fotos de alguns exemplares do acervo e das exposições, alguns programas (Jô Soares e outros). Espero que você goste do material e tenho certeza que ficará encantado com a paixão de Cláudio Alexandrino por essas lindas violas.

    Muito obrigada e até breve!

    Atenciosamente,

    Elisana de Assis
    Produtora
    Violas de Minas
    9822-2563/8627-2563
    elisanaassis@hotmail.com ou
    cacadordviola@superig.com.br
    http://www.myspace.com/claudioalexandrino

  4. COMENTAR SÔBRE ÊSTE ÍCONE DE NOSSO CANCIONEIRO É MARAVILHOSO. SAULO LARANJEIRA É SIMPLESMENTE, ESPETACULAR. NOS BRAÇOS DA VIOLA , MINHA GENTE NOS MOSTRA REALMENTE OS LUTHIES, HOMENS OU MUSICOS QUE FABRICAM A VIOLA COM MUITO AMOR. HISTÓRIAS LINDAS DE CADA PERSONAGEM QUE É ENTREVISTADO. ISTO SEM COMENTAR QUE AS SEQUENCIAS MUSICAIS SÃO LINDAS DE MORRER. PABABENS! ÊSTE PROGRAMA É MARAVILHOSO. PEÇO AO NOSSO MENINO JESUS, QUE PERMANEÇA NESTA EMISSORA ETERNAMENTE. UM ABRAÇO A TODOS DE. ELCIO LUIZ

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