Jorge Fernando dos Santos

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Barack lá, Lula aqui

Mais uma vez os Estados Unidos surpreendem o mundo. Se ainda na década de 1960 os afro-descendentes eram impedidos de votar em muitos estados norte-americanos, de lá para cá muita coisa mudou. Os negros da América não só construíram sua cidadania na luta pelos direitos civis, como também conquistaram o poder na Casa Branca.

Mas é bom não simplificar a vitória de Barack Hussein Obama II à questão puramente racial. Ele é filho de um negro muçulmano com uma branca, nasceu em Honolulu, é jovem e democrata. Tudo isso somado poderá representar uma guinada histórica nos destinos do mundo. No entanto, seu governo enfrentará sérias dificuldades não apenas devido à herança deixada por Bush como também no que diz respeito ao racismo, à intolerância do poder branco e aos interesses da indústria da guerra.

Obama terá que se proteger dos inimigos para correr atrás do prejuízo. Se há 10 anos Al Gore tivesse derrotado Bush o quadro certamente seria outro. Talvez nem tivessem ocorrido os atentatos terroristas de 11 de setembro de 2001 e a guerra guerra contra o Iraque. Vai ver até que o próprio senador Obama nem tivesse se tornado candidato à presidência. Afinal, embora aos nossos olhos haja pouca diferença entre os dois grandes partidos políticos dos EUA, o fato é que os democratas costumam ser mais habilidosos e menos radicais que os republicanos.

Não só a maioria dos norte-americanos, mas também boa parte do mundo comemora a vitória de Obama. Seu discurso de vitória deu o tom de conciliação nacional que se espera de um grande líder. No entanto, atrás da cortina de fumaça dos fogos de artifício esconde-se o risco de uma grande frustração.

O próprio Obama reconhece o heroísmo e a determinação de seu rival, o senador John Mckain. Pela idade e experiência, este teria melhores condições de enfrentar a crise do capitalismo que se anuncia. Obama ganhou, mas não foi Mckain quem perdeu as eleições, e sim o atual presidente, George W. Bush cujo saldo de governo é um dos piores da história.

Para cumprir seus compromissos de campanha, Obama terá que desafiar os poderosos da indústria bélica e do petróleo, a começar pela retirada das tropas do Iraque e do Afeganistão. Ele prometeu que no máximo em 10 anos os norte-americanos não dependerão do combustível fóssil tanto quanto hoje. Seu governo pretende levar a sério a busca de fontes energéticas não poluentes. Mais que salvar os EUA da ruína econômica, o candidato vitorioso sabe que é preciso contribuir para salvar o mundo do caos ambiental. 

Por mais esperança que se tenha, o futuro sempre reserva surpresas. No Brasil, quando Lula assumiu o poder depois de vários anos de tentativas frustradas, o país beirou a comoção. Nunca se viu tanta cordialidade entre políticos adversários como no momento de sua posse, quando recebeu a faixa presidencial das mãos de Fernando Henrique Cardoso. Até mesmo quem não votou em Lula torcia pelo sucesso do seu governo.

Com o passar do tempo, a antiga oposição foi se ajustando ao governo, trocando discursos e teorias pela prática do poder, esbarrando na corrupção e no interesse de grupos econômicos poderosos. Vieram mensalões, mensalinhos, assistencialismo, polêmicas, denuncismo, brigas internas no partido – que muitas vezes se confundiu com o governo – e pouca coisa mudou de fato no país. Não fosse a estabilidade econômica advinda da globalização, as coisas teriam sido ainda mais difíceis.

Mesmo que Lula ainda carregue no peito a chama que tantas vezes incendiou seus discursos de líder da classe operária, o fato é que a tal revolução nunca esteve tão longe de acontecer. Como disse um velho e experiente político da República Velha, é mudar para não mudar. Oxalá Obama seja mesmo diferente dos demais políticos e crie condições para promover em seu país a grande mudança que o mundo deseja assistir.  

 

4 comentários em “Barack lá, Lula aqui”

  1. Bom, Jorge, é uma grande comoção mundial essa eleição. As cobranças serão ao cubo e é impressionante que agora, que a máscara dos Estados Unidos como nação invulneravel tenha caído, justamente o alvo de sua discriminação seja encarregado de salvar a pátria. Sou viajandona, torço pra dar certo!
    Beijo

  2. Olá, Jorge,

    O derrotado não foi o homem, mas as idéias de uma era, de uma geração. Mckain, mesmo sem o querer, acabou incorporando valores associados a Bush, a quem sempre criticou. Herdou as cinzas de ser republicano em tempos de Busch, os ônus, embora seja digna sua trajetória.
    Quem foi o vitorioso? De igual forma, não um homem apenas, mas aquilo que simboliza: o multiculturalismo e a possibilidade de se flexionar as sombras para a mesa de negociação, para a diplomacia, entre outros aspectos.
    Oxalá, Barack seja digno daquilo que significa. O povo americano demonstrou desejo de mudar, de certa forma, reconheceu o desastre da escolha Bush. Espero e tenho fé em novos ares! Aguardemos.
    Obrigado e abraço.
    Daniel

  3. Caro Jorge

    Sua análise sobre a vitória do Obama é realista. Só espero que esteja equivocada quanto as dificuldades que irá encontrar pela frente. Sabemos que são muitas e é por isso que a análise é boa. A comparação com Lula quando este assumiu o Governo é oportuna. Mas vamos dar um crédito a esperança para o bem dos EUA e para o mundo.

    Abraços

    Brito

  4. Realmente todos esperam uma mudança náo só nos Estados Unidos, mas também no mundo, com a vitória de Obama. A história parece bem parecida com a nossa e o Lula. Só que para resolver tudo de uma vez é preciso ser milagreiro. O risco de ocorrer um desapontamento geral como aconteceu aqui é grande.
    Vamos torcer para que náo aconteça.

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