Jorge Fernando dos Santos

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A glamourização do crime

Tudo começou com o massacre de Columbine, nos Estados Unidos

Nem todo psicopata é assassino, da mesma forma que nem todo assassino é psicopata. Seja lá como for, o fato é que estão matando as nossas crianças. E para piorar o quadro, esse tipo de notícia vende jornais e aumenta o acesso aos meios eletrônicos. Felizmente, alguns veículos resolveram tratar tais ocorrências com parcimônia, sem promover os criminosos ou enfatizar suas ações.

Assim como políticos em busca de votos, assassinos em série ou compulsivos precisam da mídia para promover os seus crimes. Tratar esses casos com discrição talvez evite o efeito em cascata. Vale lembrar que as ocorrências de suicídio raramente viram manchete. É quase certo que isso contribua para diminuir a ocorrência do autoestermínio em larga escala.

Contudo, a função da mídia é noticiar os fatos, por mais lamentáveis que sejam. Foi o que ocorreu nesta quarta-feira (5/4), quando quatro crianças foram mortas a machadadas numa creche em Blumenau (SC). O criminoso, de 25 anos, entregou-se à polícia pouco depois. A tragédia está no topo de uma série de crimes ocorridos em escolas do país nos últimos tempos.

Gente de juízo apressado tenta associar esse tipo de ocorrência à política de liberação de armas de fogo adotada no governo passado. No entanto, há que se lembrar que o pior dos massacres ocorreu em abril de 2011, no bairro de Realengo, no Rio de Janeiro. Na ocasião, um ex-aluno da Escola Municipal Tasso da Silveira adentrou a instituição e matou a tiros nada menos que 12 adolescentes.

Em Minas Gerais

Em outubro de 2017, um estudante de 14 anos entrou armado no Colégio Goyases, escola infantil e fundamental de Goiânia, matando duas pessoas e ferindo outras quatro. No mesmo mês, em Janaúba (MG), o vigia de uma creche municipal ateou fogo em várias pessoas. Cinco morreram e outras 20 ficaram feridas. Após o ocorrido, o assassino incendiou o próprio corpo e morreu no hospital.

Dois anos depois, na cidade de Caraí, a 391 quilômetros de Janaúba, um rapaz de 17 anos atacou colegas na escola onde estudava, ferindo a tiros dois adolescentes. Em maio de 2021, um jovem de 18 anos invadiu uma escola em Saudades (SC), matando a golpes de facão três crianças e uma professora. Outras duas pessoas ficaram gravemente feridas.

No ano passado, duas ocorrências do mesmo tipo chocaram o país. Em setembro, na cidade de Barreiras (BA), uma escola municipal foi invadida por um rapaz munido de arma de fogo, facão e machadinha, matando uma jovem cadeirante. Em novembro, na cidade de Aracruz (ES), um adolescente de 16 anos atacou duas escolas, matando quatro pessoas.

Made in EUA

Antigamente, esse tipo de notícia vinha dos Estados Unidos, pela imprensa ou no roteiro de filmes sobre psicopatas e assassinos em série. Foi o caso, por exemplo do documentário Tiros em Columbine, de Michael Moore, sobre o massacre ocorrido na Columbine High School, em abril de 1999. Na ocasião, dois jovens armados até os dentes mataram 12 alunos e um professor. Ao se verem encurralados pela polícia, ambos se mataram na biblioteca da escola.

De lá para cá, ocorrências desse tipo aumentaram, passando a fazer parte da crônica policial. O incidente de Columbine provocou debates sobre controle de armas, gangues juvenis, subculturas e bullyng. Também resultou no aumento de segurança em escolas americanas com políticas de tolerância zero, sem falar no pânico moral sobre a cultura gótica, o culto às armas, o uso de antidepressivos e da internet por adolescentes, bem como a violência de filmes e videogames.

De qualquer modo, nada explica ou justifica a violência, ainda mais quando as vítimas são crianças ou adultos indefesos. De qualquer forma, a intolerância em suas várias formas (seja ela racial, social ou sexual), bem como o discurso de ódio, a impunidade, a falta de limites e a pouca resiliência diante das frustrações certamente estão na raiz do problema.

 

 

15 comentários em “A glamourização do crime”

  1. Julita Helena Silva Santos

    Muito triste! A gente fica sem palavras. Mas acho que quanto mais a mídia mostra esses acontecimentos, da a impressão que aparece mais casos.

  2. É complicado saber os motivos e a necessidade de se tornar celebridade através de assassinatos tão cruéis, o problema é muito complexo. Estamos vivendo um momento em que tudo está banalizado, inclusive a vida. Destruímos o ambiente em que vivemos, matamos animais indiscritivelmente, e matar ser humano já deixou de ser chocante. Muitos de nós não nos indignamos ou nos supreendemos com as notícias, além disso há o fator da glamourização através da mídia e das redes sociais. Documentários, podcast e programas voltados exclusivamente para isso.

  3. É conjunto de fatores: permissividade dos pais, achar que educação não é com eles e sim com a escola, uso errado das redes sociais, estímulos à violência na internet, código penal inadequado (se tem idade pra matar tem pra ser enjaulado), mudança do sistema carcerário para recuperar os jovens, mas o que mais está pesando, do meu ponto de vista, é a FALTA DE EDUCAÇÃO EM CASA, a falta de limites. Isso tem desencadeado uma busca insana pelo sucesso a qualquer preço e causado um VAZIO EXISTENCIAL com a total falta de deveres e valores enquanto pessoa. Muito boa sua contextualização, Jorge!

  4. José Domingos de Brito

    Salve Jorge
    Grato pela bela reportagem. Precisamos reiterar os cuidado que deveremos ter por aqui com esse costume até agora há pouco quase exclusivo dos norte-americanos

  5. cunha de leiradella

    belíssima exposição de fatos. mas a que se deve tudo isso? à exposição da mídia, à total liberalidade das redes sociais, ao fato de se querer que a escola ensine e eduque a juventude, quando a função da educação é de responsabilidade da família, à liberalização das armas, que não passou de um tiro nos dois pés, a quê, afinal?

  6. Jose Roberto de Alvarenga

    Estamos em tempo de reflexão e de orar para que Deus nos ilumine para criar medidas que evitem a barbárie e essa violência desenfreada .

  7. Márcia Procópio

    Ótimo artigo Jorge! Além das justificativas apresentadas no final do artigo eu acrescentaria a IMPUNIDADE que reina soberanamente neste país. Afinal, o que esperar de uma nação que ele presidente um condenado corrupto, ex-presidiário? Viva o Brasil dos crimes e da impunidade!

  8. Excelente contextualização, Jorginho. Pena que a imprensa não tenha gasto mais algumas linhas para mostrar os primórdios dessa loucura. A tecnologia adoece, enlouquece e mata.

    1. Décimo Lúcio de lucas

      Jorge inteligentes seu artigo. Enquanto não voltarmos ao dura lex sed lex infelizmente vamos estar vendo essas crueldades sem limites.

    2. Jorge, você colocou bem a dimensão da tragédia e o temor do contágio. Agora falta o *diagnostico* para chegar à prevenção imediata do contagio e ao tratamento adequado que é urgentíssimo.

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