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O caso da ‘dama do tráfico’

Proclamada há 134 anos, a República não acabou com o tráfico de influência e outras substâncias

O 15 de novembro é um feriado inútil. Comemora-se a data da proclamação da República, o golpe de estado perpetrado por militares e membros da elite imperial contra o próprio imperador, cuja filha ousou abolir a escravatura. Esse era o motivo de se realizarem as eleições nesse dia, o que já não ocorre desde a Constituição de 1988.

A bem da verdade, não podemos nos esquecer que a tal proclamação não teve a participação do povo, esse substantivo etéreo tão evocado pelos políticos – sobretudo nas campanhas eleitorais. No fundo, continuamos com os vícios do império, entre eles o tráfico de influência e de outras substâncias.

Ao ler nos jornais que a “dama do tráfico”, Luciane Barbosa Freitas, mulher do líder do Comando Vermelho na Amazônia, teve suas despesas pagas pelo governo federal ao participar do 4º encontro nacional de Comitês e Mecanismos de Prevenção e Combate à Tortura, reforço a tese: o 15 de novembro é um feriado inútil. A República, infelizmente, não deu certo.

Vasos comunicantes

Não bastassem as duas ditaduras e as tentativas de golpe que mancharam a nossa História, nossos governantes quase sempre se mostraram incapazes de unificar o país em torno de um projeto nacional. Duas exceções devem ser admitidas, a bem da verdade: a era JK e o curto governo de Itamar Franco, quando o Plano Real estabilizou a moeda e controlou a inflação.

Fora isso, pouca coisa se salva. Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, teve um excelente primeiro mandato, mas descambou no segundo, após trazer de volta a tão perigosa reeleição do Executivo. O mesmo pode se dizer de Lula, que já no final da primeira gestão sucumbia à corrupção, usando métodos repetidos no escândalo da Petrobras – episódio cuja página foi rasgada pelo STF.

Pior que a constatação do óbvio é a leniência de boa parte da imprensa, que ignora um escândalo tão grave como esse da “dama do tráfico”. Deveriam pedir a cabeça do ministro da Justiça, Flávio Dino, provável candidato a uma vaga no Supremo. Cinismo e incompetência somam-se no lamentável episódio, que evidencia vasos comunicantes entre o crime e agentes do governo. E aqui vale lembrar que José Dirceu, quando ministro, recebia líderes das Farc com honras de chefes de Estado.

Procurado número 1

Presidente da Associação Instituto Liberdade do Amazonas, Luciane é casada com Clemilson dos Santos, vulgo Tio Patinhas, procurado número 1 da polícia amazonense até ser preso, em dezembro do ano passado. Além de participar do encontro antitortura, ela se reuniu várias vezes com congressistas do governo – segundo reportagem do jornal O Globo.

Diante de tudo isso, uma pergunta não quer ser calar: será que o governo federal (não apenas o atual, mas também seus antecessores, com suas trapalhadas) não conta com mecanismos de controle que possam levantar a ficha de quem se relaciona com as estâncias governamentais? Isso com certeza evitaria constrangimentos.

Em casos como esse, há que se concluir de duas, uma: ou a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) não faz o dever de casa; ou seus relatórios são ignorados pelas autoridades e funcionários de plantão. O episódio da “dama do tráfico” é vergonho e derrubaria qualquer ministro (ou mesmo um governo) num país de índole republicana.

6 comentários em “O caso da ‘dama do tráfico’”

  1. Cipoeiro

    Independente das crenças de cada um a moral judaico-cristã permitiu a construção de uma civilização extraordinariamente dinâmica, que em dois milênios elevou em dezenas de vezes a capacidade do nosso planeta para a alimentar a humanidade e melhorar no geral a sua longevidade média e a qualidade de vida.

    A paz entre os povos sempre foi a meta essencial dessa moral, a ser obtida pela permanente disposição de cada indivíduo e de toda a sociedade a fazer a sua parte e a compreender e respeitar o outro, preferencialmente com o tempero da generosidade. Amor!

    A justificação da fraude e da maldade praticada por parte dos seus aliados ou alinhados e a ampla relativização das posições e ações contrárias à moralidade construída em milênios, no absurdo de um governo que age para se perpetuar no poder, que apoia grupos sequestradores terroristas, que abriga em seus quadros centenas de criminosos de diversos matizes, que pratica despudoramente o populismo e a perseguição política de adversários, ajustar-se com bandidos e organizações criminosas buscando atender interesses comuns, começa a soar como algo natural: afinal, o Presidente da República foi julgado e condenado por corrupção por mais de uma dezena de juízes, em várias instâncias.

  2. Este governo não vale nada, e menos ainda o congresso, sem falar do judiciário, que engloba juízes da mesma laia. Nem Deus salva este pais. Tempos sombrios já chegaram.

  3. dizem que o último gato de churchill, o jock, miou alto e bom som que a democracia era o pior dos regimes políticos, mas que mesmo sendo o pior, ainda era o melhor. e eu acredito no jock. não acredito é nos polítricos.
    gente, neste mundaréu sem porteira, além de ser honesto ser besteira, é cada um por si, e deus por ninguém. o resto é pura filosofia de sovaco. e tão pura, que as exceções se contam por quantos dedos das mãos, hem?

  4. Carlos Alberto de Oliveira e Silva

    Pelo menos o 15 de novembro de 2023 me deu a oportunidade, em uma folguinha ler este seu artigo. rsrsrsrs
    No curto governo de Itamar Franco, cujo ministro da economia era Fernando Henrique Cardoso.
    Como você está sempre atualizando os velhos tempos ao atual, onde nada mudou, que tal um artigo sobre a gafe do Lula sobre a guerra de Israel contra o Hamás e sua repercussão?

    1. Jose Roberto de Alvarenga

      É muita bobeira de uma vez só ; e ainda pagaram as passagens e hospedagem com dinheiro público!
      Até eu tenho medo dessa figura!

  5. Ótimo artigo! Infelizmente é isso mesmo, continuamos com tráfico de influência desde a época do Império somados a uma corrupção avassaladora. República? Democracia? Só para nos fazer rir!

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