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STF ressuscita a censura

No auge da ditadura, as matérias eram cortadas dos jornais sem maiores explicações aos leitores

Nesta quarta-feira (29/11), o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu por nove votos a dois que empresas jornalísticas de qualquer natureza podem ser responsabilizadas pelos crimes de injúria, difamação e calúnia cometidos por seus entrevistados.

Como assim? Quer dizer então que a empresa terá que exercer censura sobre aquilo que os outros pensam? É exatamente isso. Absurdo, mil vezes absurdo – dirá em vão o cidadão indignado. Trata-se da volta definitiva da censura à nossa pobre republiqueta de bananas.

Imaginemos a seguinte situação. Durante reportagem ao vivo ou mesmo num programa de debates, um dos convidados declara que determinado político é corrupto. Que tal o indomável Ciro Gomes, um dos poucos que ainda denunciam Lula e seu estafe? Depois da tempestiva acusação do ex-candidato, terá a emissora ou canal do Youtube que responder por ela? Pelo visto, parece que sim.

De agora em diante, para se protegerem da lei, veículos de imprensa serão obrigados a sabatinar os entrevistados antes de colocá-los no ar. Ou talvez, de forma preventiva, terão que colocar-lhes uma coleira eletrônica no pescoço, que possa ser acionada assim que o sujeito (ou a sujeita) comece a vomitar opiniões indigestas. Nada que um bom choque elétrico não possa interromper!

Guardiões da democracia

Na legislação atual, qualquer pessoa que cometa injúria, difamação ou calúnia pode ser processada pelos ofendidos. Essa é a lógica da liberdade de expressão num país democrático. E sempre funcionou desse modo. Basta lembrar o vitorioso processo de Caetano Veloso contra Olavo de Carvalho, que o acusou de pedofilia. Mas agora, não. O STF muda as regras do jogo, passando a responsabilizar o entrevistador pelo suposto crime do entrevistado.

É óbvio que a intenção por traz disso é intimidar os meios, atropelando de forma vertical a liberdade de expressão, informação e opinião pessoal. Como alertou o ministro aposentado do próprio Supremo, Marco Aurélio Mello, em entrevista ao site Poder360, a decisão da Corte traz “insegurança total” à atuação dos profissionais da imprensa e aos veículos de comunicação.

Sinal dos tempos! E o pior que a opinião pública parece anestesiada diante do absurdo. Muitos que não entendem do assunto e que não viveram no auge da ditadura, quando qualquer um podia ser punido pelo simples ato de discordar dos generais, ainda aplaudem a nefasta decisão.

O curioso é que isso ocorre na mesma semana em que milhares de manifestantes lotaram a Avenida Paulista para protestar contra a morte de um dos presos do 8 de janeiro. Pelo visto, os ministros que votaram pela punição da imprensa estão afastados da lógica e do anseio popular, disputando queda de braço contra a liberdade de expressão. Logo eles, que deveriam ser de fato os guardiões da democracia.

 

5 comentários em “STF ressuscita a censura”

  1. Augusto Carlos Duarte

    Nada a acrescentar. No entanto dirão talvez tratar-se de liberdade de expressão “relativa”.
    A tradicional frase “As opiniões emitidas são de inteira responsabilidade de quem as expressa, e não necessariamente reflete o pensamento do veículo” tornou-se letra morta.
    Do jeito que as coisas caminham, um árbitro de futebol poderá recorrer diretamente ao STF, caso um jogador ou dirigente de um clube que achar-se prejudicado externe sua opinião sobre a arbitragem. E os veículos que a registrarem, numa coletiva de imprensa, poderão ser responsabilizados.
    Exagero?
    O tempo dirá.
    Caso seja permitido ao tempo dizer.

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