Vida de candidato não é sopa. Quem vê esses ilustres senhores sorrindo nos postes nem imagina o quanto eles padecem. A começar pela dor de consciência ao contemplar o próprio sorriso largo e franco. Afinal, eles riem do quê?
Para quem não sabe, campanha eleitoral é uma verdadeira maratona para os candidatos. Haja sapato e pneus para tantos quilômetros percorridos em busca do voto. Haja saliva para conquistar o eleitor, esse ilustre desconhecido que tem a petulância de duvidar da honestidade da classe política que tanto se esforça em seu benefício. Haja óleo de peroba!
Se fosse na Roma antiga, o deus dos políticos seria Baco, pois é preciso ter muito apetite para encarar banquetes e coquetéis. Enquanto metade da população faz regime e a outra metade morre de fome, candidato que se preza nunca se furta a fazer uma boquinha, sendo obrigado a almoçar e jantar várias vezes ao dia.
É um franguinho ao molho pardo, em Minas Gerais; acarajé apimentado, na Bahia; buchada de bode, no Ceará; pirarucu no azeite de dendê, no Amazonas; churrasco de maminha de alcatra, no Rio Grande do Sul; feijoada completa, no Rio de Janeiro; e (claro!) a irresistível pizza de mussarela, meu, em São Paulo… Tudo isso regado a coca light, que ninguém é de ferro.
Com tantas calorias acumuladas ao longo da campanha, não há candidato que não engorde uns quilinhos nesta época do ano. Afinal, o pecado da gula se tornou uma virtude no manual do marketing político. E quando a turma sai de cena, logo após as eleições, com certeza pode ser encontrada nos melhores spas do país, tentando recuperar a forma e superar o trauma da comilança. Tem candidato que até sonha com comida e acaba mordendo o travesseiro.
Mas os problemas não param por aí. Tem político que sofre de tendinite na mão direita, devido à quantidade de cumprimentos. Alguns se queixam de hematomas nas costas, provocadas pelos abraços e tapinhas que recebem dos eleitores e correligionários mais entusiasmados. Outros reclamam de pisões, joanetes e bolhas nos pés.
Pior ainda é ter que enfrentar batalhões de repórteres, sempre com perguntas irritantes e indiscretas, e participar de debates com adversários que parecem ter memória de elefante. Também não é nada fácil subir os morros, pisar no barro de becos e ruas descalças, trilhar as veredas do sertão, carregar no colo crianças catarrentas e agüentar grupos de pagode e duplas sertanejadas, sabendo que são eles as grandes atrações do showmício.
Mas tudo isso vale a pena quando a vitória não é pequena. Pior é quando o sacrifício resulta em derrota e o ex-candidato não conta sequer com o consolo de uma vaguinha no segundo escalão. Foi o caso daquele vereador que fez de tudo para se reeleger e eleger um primo para o cargo de prefeito. Ele perdeu a eleição, mas consolu-se com a vitória do outro, na certeza de que seria escolhido para alguma secretaria.
Na solenidade de posse, o ex-vereador posava de papagaio de pirata com cara de galã. Em seu discurso, o novo burgomestre foi de uma objetivdade surpreendente:
– Agradeço o apoio que me foi dado, especialmente pelo meu querido primo que me emprestou seu prestígio e sua experiência de vereador. Mas, para provar que não sou adepto do nepotismo, assumo desde já o compromisso de não ter nenhum parente na minha administração.
A solenidade foi subitamente interrompida com um ruído surdo. Devido ao estresse e à grande surpresa preparada pelo primo, o ex-vereado havia desmaiado, sendo retirado às pressas pelos seguranças. Diante de tamanha decepção, perdeu a confiança na própria classe e nunca mais se envolveu em política.
* Crônica publicada na revista “Municípios das Gerais”, órgão oficial da Associação Mineira dos Municípios, em agosto de 2008, e também na coletânea “Todo mundo é filho da mãe” (Editora Ciência Moderna).
Dei uma passeada pelo seu site/blog. Bacana, né? E a crônica da maratona do candidato está ótima, realmente você retratou bem como devem ser as idas e vindas dos caras buscando votos. Abraço, Cristiana Andrade.