Jorge Fernando dos Santos

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Tive um fim de semana simplesmente estressante. Meu parceiro musical e grande amigo Francisco Saraiva, vulgo Chico Metralha, convidou-me para emendar o feriado de 15 de agosto, sexta-feira, na fazenda que foi do seu pai e que hoje pertence ao irmão Ricardo, lá em Rio Casca.

Perto da antiga sede ficam os sítios de outros dois irmãos do Chico, o Zé Maria e a Suely, mulher do meu xará Jorge Alberto. Como eu disse, foi simplesmente estressante. Assim que saímos do carro, respirei fundo e o ar puro do campo quase me provocou uma crise de tosse. Pior ainda foi a barulheira do lugar, com a água do riacho borbulhando, todos aqueles passarinhos cantando ao mesmo tempo, bois berrando no curral, galo e galinhas cacarejando e ciscando no terreiro.

E é justamente sobre galinhas a presente crônica, embora eu deva ainda destacar que a noite de sexta-feira teve lua cheia e linguiça na brasa carinhosamente preparada pelo Ricardo, que também nos serviu cachaça e cerveja gelada. Depois emendamos a noite no rancho de Jorge e Suely. Ela, infelizmente, não pôde estar presente dessa vez, devido a compromisso assumido com a filha, em BH. Mas lá também estavam irmãos e cunhados do Jorge, entre eles o Dr. Germano, cujo hobby é estudar o ciclo de vida das borboletas.

Já no sábado, Chico e eu esvaziamos uma garrafa de Germana na casa do Zé Maria, desfiando para a simpática família um rosário de canções de nossa própria lavra. Lá também estava dona Mariínha, sogra do anfitrião e viúva do famoso pintor Catu, de Ouro Preto.

Nos intervalos da cantoria, a prosa correu solta sobre vários temas, inclusive sobre o falecido artista e seu grande amigo Vinicius de Moraes. Um dia a dupla chegou a casa às seis da matina depois de passar a noite na gandaia. Dona Mariínha perguntou “por que tão tarde” e o poetinha disse que precisava esperar o dia amanhecer, pois morria de medo do escuro.

Outro episódio estressante foi assistir ao nascimento de um bezerro no curral em frente à casa do Ricardo. A vaca mocha ficou em trabalho de parto durante quase 40 minutos. Quando percebeu que havia mesmo chegado o momento de dar à luz, abriu uma roda, empurrando as comadres com um leve toque de cabeça.

A parturiente se deitou no chão, fazendo força, deixando sair de si meio corpo do bezerro. Subitamente, ela ficou de pé, deixando o recém-nascido cair no chão. Enquanto a mãe lambia a cria, a boiada, curiosa, fez fila para ver o rebento. A cena, tão comovente, lembrou-me pastores e reis magos em volta da mangedoura. Comentei com o Chico que, dessa vez, nós dois é que éramos o burro e o boi num presépio às avessas.

Mas voltando às galinhas, tema principal desse texto tão estressante quanto aquele fim de semana, eu adquiri duas poedeiras na mão do Ricardo. Para transportá-las, amarramos-lhes as pernas e as colocamos separadamente em duas caixas de papelão cujas tampas foram fechadas e amarradas com barbante. Depois colocamos as caixas no porta-malas do carro, junto com o estojo do violão e a mochila do Chico.

No meio do caminho, ao som de uma coletânea de Tom Jobim e de um estressante CD de Renato Teixeira e Rolando Boldrin, ouvimos a certa altura o ruído galináceo de uma das ilustres passageiras. Até comentamos que era sinal de que estavam vivas, apesar do desconforto da viagem.

Tão logo chegamos à minha casa, a primeira coisa que fizemos, depois de sair do carro, foi abrir o porta-malas para conferir a carga. E eis que tivemos uma grande surpresa. Uma das galinhas, na certa a mais arisca, havia saído de sua respectiva caixa e entrado de ponta-cabeça na caixa da vizinha. E vejam que estavam no escuro, com os pés amarrados, em caixas de papelão devidamente fechadas e enroladas com barbante! Nem Mister M faria um truque daqueles com tanta competência.

Soltei as duas penadas no cercado onde dormem as antigas galinhas do meu terreiro. Cerca de uma hora depois, fui ver se estavam bem, se haviam comido o milho e bebido a água que havia colocado pra elas. Tive uma nova surpresa, pois a galinha mágica havia sumido. Deduzi que estava tão estressada que bateu asas, mesmo que eu as tenha cortado antes de soltá-la.

Na manhã seguinte, a filha da vizinha veio avisar que a galinha fujona estava no lote vago, do outro lado da rua. Tentei capturá-la, mas foi em vão. Ao entardecer, deu o ar da graça e chegou a comer alguns grãos de milho que jogamos pra ela. Depois sumiu de vez e até agora não tive mais notícias.

Vai ver que a doidivanas foi pega por algum ladrão de galinhas ou devorada pelo gambá que, de vez em quando, visita o nosso galinheiro e nos causa prejuízo em nome da sobrevivência. Pode ser também que ela nunca tenha existido, sendo mera alucinação provocada pelo estresse daquele fim de semana.

Crônicas

Às vésperas do lançamento do meu livro Caiçara, que integra a coleção BH. A cidade de cada um, da Conceito Editorial, tive um fim de semana simplesmente estressante. Meu parceiro musical e grande amigo Francisco Saraiva, vulgo Chico Metralha, convidou-me para emendar o feriado de 15 de agosto, sexta-feira, na fazenda que foi do seu pai e que hoje pertence ao irmão, Ricardo, lá em Rio Casca.

Perto da antiga sede ficam os sítios de outros dois irmãos do Chico, o Zé Maria e a Suely, mulher do meu amigo Jorge Alberto. Como eu disse, foi simplesmente estressante. Assim que saímos do carro, respirei fundo e todo aquele ar puro quase me provocou uma crise de tosse. Pior ainda foi a barulheira do lugar, com a água do riacho borbulhando, todos aqueles passarinhos cantando ao mesmo tempo, bois berrando no curral, galo cantando e galinhas cacarejando e ciscando no terreiro.

E é justamente sobre galinhas a presente crônica, embora eu deva ainda destacar que a noite de sexta-feira teve lua cheia e linguiça na brasa carinhosamente preparada pelo Ricardo, que também nos serviu cachaça e cerveja gelada. Depois emendamos a noite no rancho de Jorge e Suely. Ela, infelizmente, não pôde estar presente dessa vez, devido a compromisso assumido com a filha, em BH. Mas lá também estavam irmãos e cunhados do Jorge, entre eles o Dr. Germano, cujo hobby é estudar o ciclo de vida das borboletas.

Já no sábado, Chico e eu esvaziamos uma garrafa de Germana na casa do Zé Maria, desfiando para a simpática família um rosário de canções de nossa própria lavra. Lá também estava dona Mariínha, sogra do anfitrião e viúva do famoso pintor Catu, de Ouro Preto. Nos intervalos da cantoria, a prosa correu solta sobre vários temas, inclusive sobre o falecido artista e seu grande amigo Vinicius de Moraes.

Um dia a dupla chegou em casa às seis da matina depois de passar a noite na gandaia. Dona Mariínha perguntou “por que tão tarde” e o poetinha disse que precisava esperar o dia amanhecer, pois morria de medo do escuro.

Outro episódio estressante foi assistir ao nascimento de um bezerro no curral em frente à casa do Ricardo. A vaca ficou em trabalho de parto durante quase 40 minutos. Quando percebeu que havia mesmo chegado o momento de dar à luz, abriu uma roda, empurrando as comadres com um leve toque de cabeça.

A parturiente se deitou no chão, fazendo força, deixando sair de si meio corpo do bezerro. Subitamente, ela ficou de pé, deixando cair o recém-nascido. Enquanto a mãe lambia a cria, a boiada, curiosa, fez fila para ver o rebento. A cena, tão comovente, lembrou-me pastores e reis magos em volta da mangedoura. Comentei com o Chico que, dessa vez, nós dois é que éramos o burro e o boi num presépio às avessas.

Mas voltando às galinhas, tema principal desse texto tão estressante quanto aquele fim de semana, comprei duas poedeiras na mão do Ricardo. Para transportá-las, amarramos-lhes as pernas e as colocamos separadamente em duas caixas de papelão cujas tampas foram fechadas com barbante. Depois colocamos as caixas no porta-malas do carro, junto com o estojo do violão e a mochila do Chico.

No meio do caminho, ao som de uma coletânea de Tom Jobim e de um estressante CD de Renato Teixeira e Rolando Boldrin, ouvimos a certa altura o ruído galináceo de uma das ilustres passageiras. Até comentamos que era sinal de que estavam vivas, apesar do desconforto da viagem.

Tão logo chegamos à minha casa, no Caiçara, a primeira coisa que fizemos, depois de sair do carro, foi abrir o porta-malas para conferir a carga. E eis que tivemos uma grande surpresa. Uma das galinhas, na certa a mais arisca, havia saído de sua respectiva caixa e entrado de ponta-cabeça na caixa da vizinha. E vejam que estavam no escuro, com os pés amarrados, em caixas de papelão devidamente fechadas e enroladas com barbante! Nem Mister M faria um truque daqueles com tanta competência.

Soltei as duas penadas no cercado onde dormem as antigas galinhas do meu terreiro. Cerca de uma hora depois fui ver se estavam bem, se haviam comido o milho e bebido a água que havia colocado pra elas. Tive uma nova surpresa, pois a galinha mágica havia sumido. Deduzi que estava tão estressada que bateu asas, mesmo que eu as tenha cortado antes de soltá-la.

Na manhã seguinte, a filha da vizinha veio avisar que a galinha fujona estava no lote vago, do outro lado da rua. Tentei capturá-la, mas foi em vão. Ao entardecer, deu o ar da graça e chegou a comer alguns grãos de milho que jogamos pra ela. Depois sumiu de vez e até agora não tive mais notícias.

Vai ver que a doidivanas foi pega por algum ladrão de galinhas ou devorada pelo gambá que, de vez em quando, visita o nosso galinheiro e nos causa prejuízo em nome da sobrevivência. Pode ser também que ela nunca tenha existido, sendo mera alucinação provocada pelo estresse daquele fim de semana.

     

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