O Brasil é um país onde cercas e muros parecem ter sido inventados para prender gente de bem. Enquanto a sociedade produtiva e ordeira se tranca em casas e edifícios, fazendo compras em shopping centers que mais parecem templos de consumo e segurança, a marginalha toma conta das ruas. Gangues juvenis promovem linchamentos e espancam adversários até quase a morte. Traficantes vendem bagulhos pelas esquinas e as praças das grandes cidades vão se transformando em cracolândias. O crime dito organizado ameaça até mesmo a segurança de promotores, juízes e policiais, numa clara demonstração de que o crime saiu de controle e transformou a nação em refém.
Existem muitas explicações sociológicas, psicológicas, antropológicas e até filosóficas para esse estado de coisas, mas o mais óbvio é admitir que a corrupção das elites chegou a tal ponto que se misturou com a escória da sociedade. Tanto isso é verdade que jovens ricos e de classe média alta consomem e até traficam drogas, enquanto os pais figem desconhecimento. Em vez de educar e dar limites, preferem entupir os pirralhos com bens de consumo ao menor desejo, transformando-os em insaciáveis consumidores – inclusve de drogas.
Enquanto isso, os escândalos políticos são tantos que nem mesmo a mídia, com toda sua sede de notícias ruins, consegue dar conta do recado. Mal os jornais noticiam um crime de corrupção e surge outro ainda mais escabroso. Quase nenhum resulta em punição exemplar para os culpados. Entre a morosidade do poder judiciário e o cinismo do poder legislativo, o executivo finge que governa. Dão a essa zona o nome de república democrática.
O recente assassinato de três jovens moradores do Morro da Providência, no Rio de Janeiro, é mais um reflexo de toda essa promiscuidade social. Afinal, os três rapazes foram entregues a seus algozes traficantes por homens do Exército Brasileiro, que estavam ali justamente para garantir a ordem e a segurança da população enquanto obras sociais eram executadas supostamente em benefício da comunidade. Foram presos os 12 militares envolvidos no caso e pouco a pouco a opinião pública vai se esquecendo do caso.
Em se tratando de uma força militar, a responsabilidade caberia ao oficial que ordenou a operação, pois o regulamento deixa claro que soldados não podem questionar ordens, correndo o risco de sofrer punição. Fosse este um país desenvolvido, o comandante seria levado à corte marcial e punido exemplarmente, já que sua atitude desonrou a farda e a bandeira nacional. Esse tipo de conduta talvez explique porque alguns traficantes costumam portar armas de uso exclusivo das Forças Armadas.
Enquanto isso, motoristas que adoram tomar umas e outras reclamam da lei que visa punir exemplarmente aqueles que dirigirem alcoolizados. Interessante notar que morrem mais pessoas no Brasil por acidentes de trânsito do que por armas de fogo. Fôssemos levar a sério a campanha do desarmamento, teríamos que tirar de circulação boa parte dos automóveis que trafegam pelas ruas e rodovias do país, já que seus condutores nunca levam a sério a tese de que álcool e direção não combinam.
O que o Brasil mais precisa é uma boa dose não de providência, mas de vergonha na cara. E isso é válido para aqueles que burlam o fisco comprando receitas forjadas; que oferecem suborno ao fiscal de trânsito quando se vêem ameaçados de multa; que ultrapassam o sinal vermelho alegando pressa; que furam a fila fingindo idade ou invalidez; que votam em qualquer candidato sem conhecer sua biografia e sem cobrar compromissos de campanha dpois da vitória nas urnas; que integram torcidas organizadas promovedoras de violência e não têm peito para exigir direitos e cumprir deveres cívicos.
Enfim, se o Brasil for de fato uma republiqueta de bananas, os bananas somos nós. Evoé!