Por muito tempo, Chico Buarque de Hollanda foi considerado a grande unanimidade nacional. No auge dos seus 80 anos – a serem festejados nesta quarta-feira (19/6) -, há quem o hostilize devido ao seu engajamento de esquerda. Afinal, ele nunca criticou os desmandos de governos petistas e tampouco reconheceu os crimes cometidos pela ditadura cubana e pelo atual governo da Nicarágua.
Apesar disso, ninguém de bom senso pode negar sua genialidade musical e a importância de sua obra no contexto das artes nacionais – inclusive como escritor e dramaturgo. Até porque o fato de Celine e Ezra Pound terem apoiado o nazismo não lhes diminuiu o valor literário. Tampouco García Márquez deixa de ser um grande romancista por ter sido amigo pessoal de Fidel Castro. Pelo bem das artes e da cultura, convém separar o autor da obra e a política da estética.
Um amigo me disse certa vez que considerava Chico Buarque o maior compositor popular de todos os tempos e de todo o mundo. Não conheço a fundo a música feita em outros países, mas estou certo que tal opinião está bem próxima da verdade. Se compusesse em inglês, Chico certamente teria sido páreo duro para Bob Dylan na disputa do Nobel de Literatura em 2016.
Encontro com o ídolo
Ao lado de Vandré, Caetano, Sérgio Ricardo e Tom Jobim, Chico Buarque foi quem mais me influenciou nos caminhos do fazer musical. Ao lado de Noel Rosa, Vinicius de Moraes, Aldir Blanc e Paulo César Pinheiro, eu o considero um dos maiores letristas de todos os tempos. Bastaria ter criado Construção para ser considerado um gênio da raça.
Fã do cantor e compositor, estive pessoalmente com ele apenas uma vez. O encontro se deu no Palácio das Artes, em 1994, após o show de lançamento do disco Paratodos. Por acaso, estava na plateia nosso amigo Hildebrando Pontes Neto, advogado especialista em direitos autorais. Terminado o espetáculo, ele me convidou para abraçarmos o ídolo.
Eu levava comigo um exemplar da peça A ópera do malandro, na esperança de conseguir um autógrafo. Ao ver Hildebrando, que advogava em defesa dos seus direitos, Chico abriu um largo sorriso e o abraçou fervorosamente, beijando-o no rosto. O camarim estava cheio de fãs, entre eles o pessoal do Grupo Galpão e também Fernando Brant, amigo de todos nós.
Apresentado ao artista, elogiei o show, pedi seu autógrafo no livro e saí de fininho, deixando-o entregue às tietes sob o olhar severo de Marieta, com quem ele ainda estava casado. Em 2006, Chico voltaria ao Palácio das Artes para lançar o álbum Carioca. Mesmo custando caro, os ingressos do show se esgotaram depressa.
Parceria inusitada
Conhecidos do artista, meus amigos Manoel Malaguti e Helena Jobim foram convidados, mas não puderam comparecer ao show. Gentilmente, repassaram-me os tickets e fui com a minha filha rever o nosso ídolo. Ficamos no primeiro setor da plateia, a uma distância de sete cadeiras do palco. Dessa vez, no entanto, Chico não recebeu ninguém no camarim.
Mesmo conhecendo Mário Canivello, seu assessor de imprensa, nunca tive a oportunidade de entrevistá-lo. Contudo, teria a sorte de ser seu parceiro. Como assim?, pergunta o leitor afoito, a quem logo eu explico. Seu site oficial promovera um concurso. Quem acrescentasse um verso à canção Bom conselho concorreria a uma caixa com três DVDs do artista.
Sem nada a perder, escrevi: “Ouça um bom conselho / Que lhe dou de graça / Pro velho vinho a nova taça”. Enviei a letra e fui premiado. Na mesma ocasião, compus Marcha para o Chico, gravada por mim e Déa Trancoso no CD-encarte do meu livro ABC da MPB. Enviei a gravação para ele, mas não sei se chegou a ouvir. Certamente não vai ler o presente artigo, mas desejo saúde, paz e vida longa ao grande poeta dos olhos cor de ardósia.
Jorge, é sempre uma maravilha ler seus textos.
Por gostar tanto de música e da sua “lista de ouro” de compositores, fiquei curiosa com esse “Chico, um gênio da raça”. Amei!
Desejo que vc continue tecendo proseados, livros, artigos sobre música e sobre o que mais quiser – estamos aí pra curtir e/ou aprender.
Abraço grande.
Chico Buarque e texto apaixonantes.
Chico Buarque de Holanda – Brasil corajoso, arte maior, farol – escolheu muitíssimo bem que contradições abraçar. Elas são inevitáveis. Palavras dele, embebidas em tamborins, cavacam cana, caqui, abóbora, feira. O Brasil cansado de tanta guerra, crescido de coração será sempre contente com Chico. Sempre. Vida longa, Camões do Brasil!
Maravilha de homenagem, com a sutileza de convidar-nos a separar as falácias, enfim, ninguém é perfeito. Aproveito para também destacar, reconhecer e elogiar suas habilidades de composições e criações artísticas.
chico buarque, pra mim, o grande letrista da música popular brasileira da segunda metade do século 20, e neste começo da primeira do século 21.
e vivá nova taça, sô! vale um barca velha de 2015, última safra, uai!
Todos estão de parabéns ; o Chico e o Jorge !
É muita arte e talento para a nossa felicidade !
Saboreei este texto como um bom cálice ao som de uma banda! Que gostosas recordações, grande Jorge!
Querido Jorge,
Peço-lhe permissão para encampar a sua opinião sobre Chico Buarque, um artista genial, um ser humano como poucos! Abraços do seu admirador.
Oi, caríssimo colega – jornalista Jorge Fernando, parabéns por sua frase premiada há tempos ( Pro velho vinho, a nova taça), pelo bom gosto de Chico Buarque de Holanda, este artista ímpar de nossa MPB! Chico, geminiano como eu, protegido por Mercúrio, que rege nosso signo, recebeu o sopro do Gênio! Um viva aos seus bem vividos 80 anos! Vida longa e feliz para ele que bem merece celebrações!
Bacana, Jorge, sou fã de Chico e também sua fã. Adorei o verso, parabéns, meu amigo!
Costumo dizer que o poeta está na frente do cidadão. O Chico poeta e o Chico cidadão são os mesmos, o que não acontece com a maioria dos poetas. Tenho uma admiração total pelo Chico, pela sua grande obra, pela pessoa bonita que é, e pelo seu importante posicionamento político. Viva o Chico! Parabéns grandiosíssimo ser iluminado!
Parabéns ao Chico. Tem uma bela obra. É indiscutível. A obra.
obrigado por compartilhar este bom gosto a todos nós
Chico, para mim , é o maior compositor da MPB de todos os tempos e teve a sorte de cair nas graças de Tom Jobim, (pelo perfeito lirismo de suas letras)maior músico da nossa MPB. Juntos ou separados, são reconhecidos internacionalmente como os embaixadores da nossa MPB. Privilégio pra nós por ter sido seus contemporâneos. Abraço Jorge.
Oi Jorge, tudo bem? “Pro velho vinho a nova taça”. SENSACIONAL!
Adorei o artigo e fiquei feliz por você já ter estado com o ídolo: vi inúmeros shows dele, mas nunca consegui o tão desejado abraço. Acho que vou sentar na entrada do Polietama, qualquer dia rsrs.
Sensacional “pro velho vinho a nova taça!” . Nem comentei sobre os equivocados que tem birra com o Chico por causa do seu posicionamento político. Primeiro porque você disse muito bem e segundo porque o Chico Buarque de Holanda é PATRIMÔNIO NACIONAL e está acima de qualquer colocação idiota a seu respeito.
Quanta memória boa e ao som de música boa, não é? E que ótima continuação para a letra de chico. Vida longa ao grande compositor! Que possamos ouví-lo juntos sempre, como em 2006.