Autorizadas pelo Ministério Público Federal, entidades afro-brasileiras produziram em 2011 um vídeo de direito de resposta coletiva a uma reportagem da TV Record. O programa foi gravado, mas a emissora do bispo Edir Macedo recorreu da ação e conseguiu adiar a exibição.
Intitulado “Diálogos das Religiões”, e tendo quase uma hora de duração, o vídeo prega a tolerância religiosa e foi produzido pela TV PUC com a participação de representantes de entidades afro-brasileiras, católicas, budistas e muçulmanas, além de artistas e jornalistas.
Grupos católicos também têm reagido ao que chamam de “perseguição” da Igreja Universal do Reino de Deus. Um movimento articulado nas redes sociais, auto-intitulado “Brasil Sem TV Record”, conclama internautas a boicotarem a programação da emissora.
Mesmo que não professe religião, qualquer pessoa de bom-senso deve defender quem se sente atacado no seu direito de culto. Afinal, a própria Constituição Federal garante esse direito e a legislação em vigor considera crime o preconceito religioso.
Monopólio da fé
Não há sentido na ideia marxista de que a religião seja o ópio do povo, mas há que se reconhecer que ela entorpece os seguidores toda vez que se torna um negócio ou monopoliza a divindade.
Desde que o mundo é mundo, e principalmente após o advento cristão, a religião tem dividido os homens mais que a própria política. Não precisa ser historiador para reconhecer que algumas das maiores atrocidades da história foram praticadas em nome da fé e do fanatismo religioso.
Contudo, quem já leu os Evangelhos sabe que Jesus não pregava propriamente uma religião, e sim o amor a Deus e ao próximo. Consta no Novo Testamento que ele só foi ao templo duas vezes em toda sua vida: quando criança, para discutir com os doutores; e já adulto, para expulsar os vendilhões.
Séculos mais tarde, as cruzadas promovidas por papas e reis católicos massacraram sarracenos e pagãos, enquanto judeus e hereges eram queimados pela Inquisição. Os islâmicos, por sua vez, responderam às incursões em seus territórios perseguindo e dizimando comunidades cristãs.
Condição histórica
Reivindicada por três religiões que adoram o mesmo Deus, Jerusalém tornou-se palco de confrontos e atentados em nome da fé. Os próprios muçulmanos se veem divididos entre xiitas e sunitas, enquanto o Judaísmo tem as linhas progressistas e ortodoxas de interpretação da Torá.
O mais intrigante, no entanto, é que no mundo antigo a intolerância religiosa não chegou aos níveis registrados depois de Cristo. Talvez por adorarem a vários deuses, os politeístas não se matavam em nome deles. Os gregos, por exemplo, mantinham um templo ao deus desconhecido, reservado aos estrangeiros.
Surgido no antigo Egito, o monoteísmo conquistou os israelitas e se espalhou pelo mundo. No entanto, se o lema do Antigo Testamento é “olho por olho, dente por dente”, a lei de Jesus é a do perdão e do amor ao próximo – mesmo sendo este um romano ou samaritano.
Por sua própria condição histórica, e pelo fato de ser desde sempre um país cultural e racialmente miscigenado, o Brasil não pode retroceder aos patamares da intolerância religiosa. Discriminar este ou aquele grupo religioso é desrespeitar a lei e a própria Declaração Universal dos Direitos do Homem.
* Artigo publicado nos sites www.observatoriodaimprensa.com.br e www.domtotal.com.br